3.Carona

Ele me olhou ainda sorrindo e disse:

- Bom. Minha moto está ali vamos.

Ele pegou a minha mão e me levou até a sua moto.

Como não conheço muito de motos o que posso dizer é que era uma moto grande e preta, ele pegou um capacete que estava pendurado em um dos guidons – eu acho que se chama guidom – e me deu como não vi outro:

- Há... E você?

- Ah! Eu só tenho um capacete, pode usá-lo.

- Tudo bem então.

Ele deu um leve sorriso e subiu na moto.

- Vamos – disse-me ele.

- Claro.

Foi um pouco complicado subir a moto pôr ela ser tão grande mas consegui.

- E então para onde vamos?

Ele virou seu rosto para trás e abriu a boca para falar algo, mas eu o interrompi.

- Há... Você está com pressa? – disse eu.

- Nenhuma.

- Eu queria mostrar a você um dos meus lugares preferidos aqui da cidade antes de você me levar para casa você se importa?

- Até parece que você leu minha mente, eu iria te perguntar agora se você tinha algum lugar legal para nós irmos antes de você ir para casa. Eu com certeza não me importo.

- Então tá certo.

Iria levá-lo a um lugar fabuloso perto da minha casa em que eu vou sempre que quero pensar um pouco. Apontei para ele uma avenida que se seguia ao lado do estacionamento, a seguimos até entrar na estrada, fomos pela estrada reta e o pedi para entrar em um caminho de terra, ficamos cerca de cinco minutos subindo por esse caminho até o topo da montanha. Ficamos calados por todo o caminho a não ser pelos meus comandos de descer, subir, virar. Quando chegamos ao topo da montanha não tinha mais para onde ir, de um lado só tinha árvores imensas e de outro um penhasco, então, obviamente, ele parou. Tirei o capacete e desci da moto e ele também.

- E aí o que achou?

Estava de noite e a única luz que havia era a do luar, tinha estrelas por todo o lado, não o sei, mas pra mim aquela era a melhor vista que poderia ter.

- Incrível isso me lembra muito Volterra.

- Lá é assim?

- Quase, a cidade é cercada de árvores e montanhas, as vezes quando queria pensar na vida, entrava floresta a dentro e ia para o topo de uma montanha, ficava lá sentado a noite inteira, por isso me lembra Volterra, isso aqui é um pedacinho de lá.

Ele se afastou e foi mais para perto do penhasco e se sentou no chão.

- Vem! Ou vai ficar aí em pé?

Sorri, fui até ele e sentei ao seu lado, ele se virou para mim e me olhou como um homem que quer comprar um tênis da Nike, mas não tem dinheiro e fica olhando através do vidro da loja o tênis, ele deu um sorriso torto:

- Então Kris... Falei de mim a tarde toda, me fale mais sobre você agora. Conte-me sua história.

E me fitou esperando eu começar.

- Te garanto que minha história não é tão interessante quanto a sua.

- Mas mesmo assim, gosto de ouvir, por favor, não custa nada, ou custa?

- Tudo bem. Mas não me culpe se você achá-la ruim.

- Qualquer história que você conte não será ruim – ele me olhou com mais um sorriso torto.

Minha história não era lá muita coisa, mas já que ele estava pedindo não custava nada contá-lo, então comecei:

- Bom meu pai e minha mãe eram felizes, só que minha mãe era muito ciumenta e meu pai muito bonito, pela versão do meu pai, todas as mulheres olhavam para ele e minha mãe achava que ele que estava olhando para elas, e pela versão da minha mãe, meu pai olhava para todas as mulheres e depois falava que elas que estavam olhando pra ele, em minha opinião, a versão da minha mãe é correta, foi sempre assim até que aos meus dez anos minha mãe se cansou disso e se separou do meu pai, após se separarem ela ganhou minha guarda e fui com ela para Ottawa no Canadá, meu pai ia me visitar sempre que dava lá, e minha mãe sempre o tratava mal quando ia, quando tinha quatorze anos ela encontrou o Peter, um dono de padaria, e se casou com ele, ele era chato pra caramba, e eu santinha demais para bater boca com ele, eu já tava de saco cheio dele aos meus quinze anos, e resolvi fugir de casa, nunca gostei de Ottawa e meus amigos eram todos um bando de falsos, então consegui com muito custo pegar o número do telefone do meu pai dentro de umas das agendas, minha mãe só me deixava ligar para ele com o consentimento dela e com ela perto, então foi realmente difícil achar sem ela ver, liguei pra ele e expliquei a situação, como ele nunca gostará de eu ter ido pra lá e sempre me dizia sim para qualquer coisa ele disse que era pra mim pegar o dinheiro da conta do meu fundo universitário e ir para a casa dele que depois ele recolocaria o dinheiro, e o resto ele resolvia por si só, peguei o dinheiro uns três dias depois e comprei uma passagem de ônibus, foram 6 dias de viagem, quando cheguei na estação de principal de ônibus de Sacramento liguei para o meu pai e ele veio me buscar, ele deixou passar uma semana e ligou para minha mãe alegando que eu apareci lá do nada falando que estava cansada de Ottawa, e aí começou outro processo para ver com quem realmente era melhor eu ficar, e dessa vez meu pai ganhou, e eu fiquei aqui na Califórnia, reencontrei meus antigos amigos e fiz novos, montei uma Banda, que há um tempo acabou se separando por causa de brigas, já fiquei doidona em muitas festas, e já fiz muita coisa errada, mas já cansei de ser a garota “errada”.

- Mas o seu pai não te xinga por você ser tão errada?

- Meu pai não ta nem aí, ele é um meninão ainda, ta mais pra eu cuidar dele do que ele cuidar de mim, ele é muito liberal.

- Legal.

- É.

- Sua história não é ruim – disse ele bem pensativo.

- Mas não é tão boa também.

- Com certeza não é comum – ele disse já se levantando.

Estendeu-me a mão para me ajudar a levantar e disse:

- Vem vamos andar um pouco.

Isso me assustou um pouco, acho que foi nessa hora que percebi minha situação, esta com um garoto que acabará de conhecer no meio da floresta a noite e ele estava me chamando para eu ir dar um ‘passeio’ com ele no meio daquela escuridão.

Ou eu devo ter bebido Coca-cola demais pra chegar a esse ponto, ou eu puxei muito a paranóia que minha mãe tem com tudo e com todos.

- Há... Você não acha que ta muito escura não?

Ele parece ter percebido a situação em que estava – ou a minha cara de meio assustada – e deu um sorriso dizendo:

- É claro que a floresta tá escura né! Tá de noite! – ele me fitou por um instante – Tudo bem... É melhor eu levá-la logo pra casa – disse ainda rindo.

- Porque está rindo?

- Estou rindo porque parece que só agora que você sacou que você está com um cara que nem conhece direito no meio de uma floresta à noite!

Corei um pouco.

- Olha você é cara super legal, mas olhe o meu lado da situação.

Fiz uma careta.

- Calma eu não sou nenhum assassino da serra elétrica – ele riu.

- É deu pra perceber.

- Então? Vamos para sua casa?

Pensei um pouco.

Minha casa era bem perto, cinco minutos caminhando em uma trilha – que meu pai fizera quando vim para cá temendo que eu me perdesse no meio da floresta – e estaria na minha casa. A trilha não era ‘bem no meio’ da floresta, ela dava uma volta nela, então dava pra ir numa boa até minha casa.

- Não precisa me levar, minha casa é bem atrás daquelas árvores ali – disse para o Kal apontando para ele a direção – tem uma trilha ali.

- Há! Deixa disso. Ta com medo de mim ainda?

- Não eu não to com medo – e realmente não estava.

Ele pensou uns segundos:

- Sério? Então não vai se importar se eu for com você não é mesmo?

Queria ter respondido ‘claro’ só para mostrar que realmente não me importava, mas não disse:

- Mas e pra você voltar? Não acho bom deixar sua mot... – ele pousou o dedo em minha boca.

Quem disse que ele tinha intimidade o suficiente para fazer isso comigo? E porque qual bendito motivo meu coração disparava tanto quando ele tocava em mim? E porque não consegui questionar com ele o porquê dele ter tanta intimidade comigo sendo que ele acabará de me conhecer?

- Shhh... - disse ele de repente cheio de confiança – sem mais desculpas, não sou nenhum bandido para você ficar me evitando de repente por uma razão boba, e é claro que não irei deixar uma dama andando em meio a floresta sozinha a noite, por mais que seja uma trilha, onde estaria o meu cavalheirismo se deixasse tal proeza? – nunca vi alguém me convencer da sua companhia com tamanha formalidade como ele me convenceu – vamos! – ele falou encaixando sua mão na minha – outra vez me perguntei “por que tanta intimidade? Será isso coisa dos Italianos?

E assim fomos, em silêncio, conforme andávamos pela trilha ele foi soltando minha mão da dele, quando soltou completamente sua mão da minha a colocou em minha cintura, deveria ficar com medo dele por me agarrar ou coisa do tipo – mas sua mão era gelada e firme, e eu adorei – me sentia confortável com sua mão pousada ali na minha cintura, me sentia segura.

Então pensei, se ele queria intimidade comigo, e a daria.

Coloquei lentamente a mão em sua cintura – e bem definida, forte – ele se sobressaltou um pouco com isso:

- Não está mais com medo de mim?

- E estava antes? – falei demonstrando indiferença.

- Parecia... Eu na sua situação ficaria com um pouco de medo – retrucou-o.

- Tenho que admitir que estava com um pouquinho só de medo, mas já passou.

Então comecei a ver os primeiros sinais de luz – da minha casa – e ele também reparou:

- Essa é sua casa?

- É.

- Parece grande em!

- É bastante grande.

Meu pai gastava praticamente quase todo o dinheiro de seu salário com a casa, e quando ele não tinha nada em mente para construir nela, começava a comprar aparelhos e eletrodomésticos de última geração para colocar dentro dela.

Chegamos à frente da casa.

- Nossa sua casa é linda. Caramba, três andares, janelas de puro vidro, estou realmente impressionado, você não tinha me dito que era rica – disse Kal espantado.

- E não sou meu pai que tem. Um pouco de dinheiro.

- Tá! Correção... Seu pai tem muito dinheiro – ele disse ainda observando a casa – de que ele trabalha?

- Ele é Bombeiro.

- E que cargo ocupa?

- Não sei, acho que é comandante ou coisa assim.

- Quero ser bombeiro – disse ele com um careta.

Paramos em frente à porta da minha casa.

- Bom está entregue – chegou perto de mim e segurou minhas duas mãos na dele – foi um prazer enorme conhecê-la – falou com uma voz galanteadora.

- O prazer foi todo meu Kal – o que era verdade – não é todo dia que você conhece um gatinho daquele naipe.

- Bom vou indo então – murmurou ele.

- Tchau.

- Te vejo na escola!

Dei um sorrisinho e ele se foi. Fechei a porta e entrei.

- Uau! – disse a mim mesma.

Caramba que gatinho era aquele!

Subi as escadas e tomei um banho, vesti um moletom velho e desabei na cama.

Que dia incrível. Conheci um cara lindo, que para minha surpresa virou meu amigo – com um dia. Fala sério! Eu devo ser muito sortuda mesmo!

Foi que me lembrei do meu grande amigo.

Como estaria o Rik agora? Será que ele está com muita, pouca ou nenhuma raiva de mim? Deveria ligar para ele e pedir desculpas por não aceitar sua carona?

Não. Melhor não ligar para ele. Amanhã quando acordar eu vou a casa dele e converso com ele. Afinal, nem meu namorado ele é.

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Censura

12 anos

Gênero

Romance e um pouco de ação.

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